sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Era um dia comum...

Estava reclamando que há algum tempo andava meio sem inspiração para escrever, precisava de emoção, de uma situação, uma experiência nova, e agora escrevo possuído por sentimento ímpar.
Eu, Camila, Carol, Ruan, Cássia e Renato. Adolescentes adoram falar sobre sexo, contando experiências sexuais e rindo muito até sermos interrompido por um rapaz de uns 30 anos, negro, bigode e sobrancelhas cheias, barba falhada com expressão afobada e muito apressado, é impressionante os detalhes que guardo dele, a partir daí ficaria boa parte do tempo com a cabeça baixa tentando tirar minha corrente de prata, estava anunciado o assalto.
Não tenho interesse algum em fazer uma enxurrada de crítica à insegurança pública do estado, nem aos moradores de rua estão poupando.
Balançando o revólver bem no nosso rosto, pedia os celulares, relógios e minha “prata”. Carol e Cássia saíram “ilesas” foi só emoção, delas ele não levou nada – Graças a Deus – Carol olhando apavorada aquela arma demonstrava completa ingenuidade e inexperiência, não olhei a Cássia – uma pena – perdi o momento de ver escorrer pela calçada o gênio forte daquela menina que dispensa carinho, delicadeza, sensibilidade e outros bons sentimentos gratuitos.

Renato. Olha pela última vez seu segundo celular em menos de seis meses ir parar nas mãos do meliante, ou melhor, na sacola plástica preta e amarrotada que o individuo segurava com a mão esquerda. – Na outra, uma ameaça constante – nem acreditava.
Camila. Pressionada, entrega o celular com uma voz trêmula que timidamente anuncia que o choro está pedindo licença à maquiagem. Frágil, nunca sentiu uma voz de assalto tão perto. Diferente do Ruan que perdeu um relógio caríssimo (R$ 15,00) – mas era dele – celular, me olhava surpreso enquanto tirava a corrente e entregava mais um celular.

Eu demorei vários segundos, alguns poucos minutos para assimilar toda situação, depois de três tentativas de assalto a quarta foi bem sucedida (felizmente). No instante em que o vi tentando sacar a arma, senti a instabilidade, notei a impotência, percebi a vulnerabilidade, a vassalagem da qual todo homem tem sobre sua vida, o ditado “Pra morrer só precisa estar vivo ” nunca soou tão bem na minha mente, olhava tentando de alguma forma passar para as meninas o mínimo que fosse da sensação que tudo ia acabar bem, mas minha própria incerteza desmentia a boa intenção.
Foi embora! Acabou? Teoricamente, sim.
 “...Polícia para quem precisa, polícia para quem precisa de polícia...”¹
Buscamos ajuda, nos deparamos com as frases feitas “é normal!” respiramos e vamos assistir à aula.
Culpa? Não sei.
Ouvimos de consolo “ah ele vai vender e comprar tudo de droga, vai morrer de overdose” Sinceramente, não quero isso.
De toda experiência negativa tira-se algo positivo (ainda estou pensando nisso), para quem acredita afirmo que foi Deus quem nos protegeu do nervosismo e aparente inexperiência daquele assaltante.
O que ainda consegue mexer comigo é a grande possibilidade de provavelmente isto vir a se repetir.


Amorim, Anderson – Era um dia comum... – Maceió(AL), Novembro|2010
¹POLÍCIA, música – Titãs|Cabeça Dinossauro,1986